SĂO PAULO (Reuters) - A
preparaçăo da seleçăo feminina de futebol para as Olimpíadas de Atenas
inclui um sinalizador de emoçőes e ajuste hormonal das atletas, em uma
iniciativa inédita coordenada pelo técnico René Simőes.
Como năo há um campeonato regular de
futebol de campo no Brasil, as jogadoras pouco treinam e jamais passaram
por tratamento médico completo antes de um torneio, mesmo pela equipe
nacional.
"Tem sido feito até um acompanhamento
hormonal. Muitas nunca tinham ido a um ginecologista e agora temos uma
profissional que faz parte da nossa equipe, está sempre lá, conversando,
tratando", disse Simőes em entrevista ŕ Reuters.
"Estamos vendo também o problema de
menstruaçăo, muitas delas ficariam menstruadas no ponto crucial da
Olimpíada, 9 ou 10 delas. Todos os detalhes estăo sendo trabalhados para
que a equipe chegue equilibrada (a Atenas)."
Desde o início de março, quando Simőes
assumiu o comando do time feminino, elas passaram a ter uma equipe com
psicólogo, fisiologista, fisioterapeuta e outros profissionais que as
auxiliam na preparaçăo para Atenas.
"Deixar um banco de dados vai ser nossa
maior contribuiçăo: como nutri-las, como treiná-las, como observá-las,
como fazer um trabalho", explicou o técnico carioca.
Pai de tręs filhas e com passagem por
times femininos dos Estados Unidos nos anos 80, Simőes sabe como lidar
com as atletas e cuida de cada particularidade para a seleçăo conquistar
uma medalha olímpica após dois quartos lugares nos últimos Jogos, em
Sydney-2000 e em Atlanta-1996.
Ele criou um sinalizador de emoçőes, o
"emociômetro", utilizado na Granja Comary, em Teresópolis, onde elas
estăo concentradas desde 8 de março, saindo esporadicamente para
"recarregar as baterias afetivas".
Através de um quadro, geralmente
colocado no refeitório, com os nomes delas e também os da comissăo
técnica, todos mostram através de cores o humor que estăo no dia.
"Quando văo para o café, elas indicam a
cor: verde, laranja ou vermelho. Se for verde, está tudo bem, ela
acordou de bem com a vida, a cabeça está ajustada."
"O laranja é o meio-termo, ela pode
estar equilibrada, mas năo estar bem hoje, e o vermelho é que ela năo
está bem. Desta forma, a gente sabe o que está acontecendo e como nos
aproximarmos delas", acrescentou o técnico, que levou a equipe masculina
da Jamaica ŕ Copa do Mundo de 1998 e já trabalhou no Oriente Médio.
Simőes garante que os vermelhos săo
poucos, mas existem. "É impossível năo ter problemas, mas como vocę
resolve esses problemas...aí é que está o segredo."
AMISTOSOS
Para conquistar uma medalha olímpica, a
estratégia do técnico brasileiro foi transformar a seleçăo em uma
"escolinha", com muita aula de tática e preparaçăo física.
Até agora, houve uma melhora de 50 por
cento em relaçăo ŕ performance das brasileiras no início do trabalho, de
acordo com Simőes, mas elas ainda tęm muito o que aprender.
Ele comentou que o time precisa evoluir
em força física, resistęncia, velocidade, conhecimento tático e
aplicaçăo tática, privilegiando a parte defensiva. "O problema
brasileiro na defesa existe em todos os esportes. E năo é só o setor da
defesa, é o time inteiro, porque todo mundo tem que defender, tem que se
aplicar muito".
A seleçăo brasileira tem realizado
amistosos contra equipes masculinas juvenis e em abril fez uma excursăo
para os EUA, enfrentando equipes universitárias e a seleçăo local, com
derrota por 5 x 1.
"Deu para avaliar a distância que
estamos dos Estados Unidos. Elas estăo muito bem fisicamente, muito
fortes e concentradas na parte tática. Estamos estudando e fazendo uma
escolinha mesmo", disse ele.
Apesar da goleada, Simőes se mantém
confiante na evoluçăo do time e nas chances de medalha em Atenas.
"Subir ao pódio vai ser um grande passo,
um grande pręmio para essas meninas, que săo desbravadoras, guerreiras.
Tanto que batizamos o projeto de alquimia olímpica, transformar o sonho
em ouro."
MILENE FORA
Entre as 26 convocadas pelo técnico para
treinos em junho, existem tręs sem clube e cinco "estrangeiras", sendo
que duas jogam na Espanha e tręs atuam na Suécia -- seleçăo que eliminou
o Brasil da Copa do Mundo de 2003 nas quartas-de-final.
Principal chamariz da seleçăo feminina,
a ex-mulher de Ronaldo, Milene Domingues, que atua no Rayo Vallecano,
chegou a realizar treinos na Granja, mas năo foi selecionada entre as 18
que viajaram aos EUA e ficou de fora das últimas convocaçőes.
A meia-atacante tem poucas chances de
disputar as Olimpíadas por falta de ritmo de jogo. Ela só vai a Atenas
se tiver "melhorado muito".
"A Milene é fruto do futebol feminino
brasileiro. Desde pequena gostava de jogar, mas năo tinha como. Ela joga
bem, é inteligente, tem visăo de jogo, mas a dinâmica dela ficou muito
defasada em relaçăo ŕs outras que jogavam futebol de salăo", comentou o
treinador, que lamentará a ausęncia dela.
"Ela é uma pessoa especialíssima, o
grupo adora. É uma pessoa humilde, carismática. Se dependesse do grupo,
o grupo levaria".