O trovador pernambucano
Lenine foi o grande vencedor do 3º Prêmio Tim de Música entregue na
noite desta quarta-feira no Teatro Municipal do Rio. Das seis indicações,
ele levou quatro prêmios como melhor cantor pelo voto popular, melhor
disco e cantor pelo CD "In Cité", gravado ao vivo em Paris com a
baixista cubana Yusa e o percussionista argentino Ramiro Musotto, e
melhor canção para "Todas elas juntas num só ser", parceria dele com
Carlos Rennó.
Mestre Sivuca, com cinco indicações, levou dois prêmios, Ivete Sangalo,
de pé quebrado, mas ainda saliente no palco, levou dois, e o grupo Roupa
Nova também dois (veja a lista completa de premiações). O homenageado
deste ano foi Baden Powell, morto há cinco anos, que teve composições
suas em parceria com Paulo César Pinheiro e Vinícius de Moraes
executadas por Zélia Duncan, Mônica Salmaso, Ivete Sangalo, Zeca
Pagodinho, Lenine, Ney Matogrosso e Pedro Luís e a Parede, entre outros.
Depois da cerimônia de pouco menos de duas horas, houve uma festança no
imenso salão rococó do Clube Ginástico, também no centro do Rio, com
decoração vermelha, grupo de gafieira e discotecagem de Marcelo Janot,
além de um jantar fartamente regado a uísque 12 anos e champagne. Lenine
chegou ao salão e não conseguiu sair da entrada por quase uma hora, como
o segundo mais assediado da noite (mesmo vencedor, ele perdeu para o
jogador Ronaldo ex-Cicarelli, cercado por uma penca de fãs e fotógrafos).
Lenine se declarou feliz da vida com os troféus, especialmente o de voto
popular, uma surpresa, porque tinha pela frente pesos pesados de
popularidade como Leonardo, Fábio Jr., Lulu Santos, Jorge Aragão, Djavan
e Gilberto Gil. "Essa me deu um gostinho muito bacana," comentou ele
entre abraços, beijos e aluguéis de ouvido por íntimos de ocasião. Ele
contou que tentou ligar para Ramiro mas não conseguiu e que, com Yusa,
não tinha jeito porque era difícil falar com Cuba. "Essa vai pela
embaixada. Lá é tudo muito complicado."
Contou que semana que vem embarca para a França, onde terá novamente uma
overdose de emoção com o concerto que fará no Teatro Zenith de Paris com
a orquestra nacional Ile de France, regida por David Levi, e um coro de
1.500 crianças. A apresentação, marcada para o próximo dia 24, está com
os ingressos esgotados.
Ele gostou especialmente da premiação da sambista paulista Dona Inah, de
70 e tantos anos, como revelação, e da orquestra de violões, uma espécie
de unanimidade como melhor apresentação da noite. Integraram a dita cuja
João Bosco, José Paulo Becker, Marco pereira, Badi Assad, Hélio Delmiro,
Ulisses Rocha e Marcel Powell, outro filho de Baden, revezando-se em "Berimbau"
e 'Samba em prelúdio", com destaque para Marcel, que solava com a
agilidade de um John McLaughlin, como observou bem o apresentador da
noite, Evandro Mesquita, servindo-se no bandejão chique do Ginástico. Na
festa, João Bosco ainda não conseguia tocar o chão de tanta felicidade
de ter estado no meio dessa turma.
Philippe Powell, filho de Baden, abriu a noite tocando piano ao lado de
Wagner Tiso com o tema "Consolação", de seu pai. Ele disse que estava
muito feliz com a homenagem e disse que foi justo terem escolhido apenas
parcerias de Baden com Paulo César Pinheiro e Vinicius de Moraes para a
noite.
"Sem querer diminuir os demais parceiros de meu pai, acho que reflete
bem duas áreas principais dele, o samba com Paulo César e os afrosambas
com Vinícius, uma parte importante da carreira," disse ele.
As premiações foram feitas com todos os agraciados de cada categoria ao
mesmo tempo no palco. Nenhum deles teve a oportunidade de abrir a boca
para agradecer, nem em casos especiais como de Sivuca, aplaudido de pé,
e Alcione, tricampeã como melhor cantora de samba. Este critério deu uma
enxugada na cerimônia, mas suprimiu o direito de expressão e algumas
boas tiradas que certamente surgiriam.
Evandro apresentou com Fernanda Lima, que deu algumas escorregadas e
estava com um vestido longo de cauda grande muito do feio. Eles deram
pinceladas biográficas de Baden a noite toda, apresentando os números
musicais e as diversas categorias, algumas bem confusas, como a de
Canção Popular que colocou Dulce Quental, cantora cult e chique, ao lado
da caminhoneira Roberta Miranda e da gatinha pop Luiza Possi.
Evandro deu umas descontraídas, mas não o suficiente para tirar a
solenidade e a caretice da cerimônia. Ele contou que certa vez Baden foi
convidado para se apresentar na Casa Branca para o presidente Lyndon
Johnson, mas não foi porque tinha show marcado no Rio com Elis Regina (o
que só depõe a seu favor). E que na primeira vez em que Baden e Vinícius
marcaram encontro para começar a parceria, nenhum dos dois apareceu.
Alguns artistas cantaram bem, mas não convenceram. Melhor seria se
pudessem cantar as músicas do seu jeito, em vez de seguir os ditames da
produção que colocou todo mundo acompanhado pelo grupo de Wagner Tiso.
Zeca Pagodinho cantou um "Formosa" com uma falta de ânimo de quem não
tinha entornado nem umazinha até aquela hora ou tinha entornado demais,
e saiu correndo. Lenine cantou bem "Lapinha'', mas o arranjo não é a
praia dele, ficou estranho. Ivete Sangalo, de pé quebrado, pouco se
mexeu ao cantar "Deixa" numa interpretação contida para os padrões
sacolejantes dela. A canção não deixou espaço para ela usar seu famoso
bordão "sai do chão, galera". Ney Matogrosso e Pedro Luís e a Parede
foram dos mais aplaudidos da noite com uma interpretação agitada de "Canto
de Ossanha", com agudos lancinantes de Ney.
A noite foi encerrada com Zélia Duncan e Marcelo D2 cantando o "Samba da
benção", de Baden com Vinícius. Claro que ela cuidou do samba e D2 da
benção, aquele rap do velho Vinha que pedia a benção a meio mundo. Os
dois adaptaram, citando o próprio Baden e os artistas que se
apresentaram, todos em cena para a apoteose final.
Antes disso, o ex-senhor Cicarelli foi convocado por Evandro para
entregar o prêmio de melhor cantor e cantora pelo voto popular e não
pediu dispensa, chutando até uma bola para o palco antes de entrar. No
restante da noite, ele foi bastante assediado por moçoilas casadouras
interessadas em consolá-lo de seu recente revés amoroso. Numa noite em
que se tropeçava em famosos a cada passo, ele foi a grande estrela,
mesmo sem nunca ter cantado na vida, pelo menos no sentido artístico... |